Questão Agrária


Em Casa Grande não temos nenhum parcelamento e eu acho que isso vai durar bastante tempo, apesar da pressão imobiliária que nos rodeia. Somos pressionados pelo Gama, Recanto das Emas e Riacho Fundo. O núcleo rural Ponte Alta Norte, que era altamente produtivo, infelizmente hoje está praticamente todo subdividido e é um mau exemplo para Casa Grande”, alerta o professor Aníbal.

Repórter – Antes de existir Casa Grande este lugar era a fazenda Bom Sucesso. Como se deu a passagem de fazenda para núcleo rural?

Aníbal – Quando Juscelino Kubitschek decidiu construir Brasília baixaram uma lei pela qual todos os terrenos do quadrilátero seriam desapropriados e passariam a ser do governo, que indenizaria cada proprietário. Aconteceu, porém, que o governo não conseguiu pagar a todos. Com isso, em algumas áreas, os legítimos proprietários entraram com processo de reintegração de posse. Aqui na região havia as fazendas Ponte Alta e Bom Sucesso. A fazenda Ponte Alta foi indenizada e a fazenda Bom Sucesso não. Então os ex-proprietários reverteram o processo de desapropriação e, em 1977, o senhor Pedro Machado, assessorado pela empresa paulista Iara Agroindústria, adquiriu os direitos da fazenda Bom Sucesso e a fracionou em lotes de 2 hectares (20 mil metros quadrados), que é o menor módulo exigido pelo Incra para ser considerado área rural.

Repórter – Como é que o senhor veio morar aqui?

Aníbal - A Dione, minha mulher, comprou nossa chácara entre 1979 e 1980. Mas, em 1982, a Terracap entrou com um processo de reivindicação de posse. Confessou que a fazenda Bom Sucesso não havia sido desapropriada, mas que o loteador havia invadido área maior do que lhe era devida. Na época não havia marcos muito bem definidos. O embate judicial se deu entre a Terracap, a Iara Agroindústria e nós, que havíamos adquirido as chácaras. Ganhamos no primeiro e no segundo julgamento. No julgamento dos embargos infringentes estava 4 a 4 e o juiz que daria o voto de minerva morreu durante a seção. Seu substituto, aspirando a se estabelecer no cargo, deu um voto político com ganho de causa para a Terracap. Nós apelamos para o STJ que julgou matéria não competente devolvendo o processo para a Terracap.

Repórter – E então?

Aníbal – A Terracap mandou um oficial de justiça para fazer a reintegração de posse. 
O oficial nem sequer sabia onde ficava a área e foi procurar Casa Grande lá na Fazendária. Depois achou o caminho. Eu era o presidente da associação dos moradores de Casa Grande. Bento Cayres, nosso companheiro e advogado, me orientou para que eu não assinasse nada, que ele e outro advogado iriam tratar da questão. Numa só noite levantamos mais de 300 escrituras registradas. Quando o oficial de justiça chegou encontrou aqui uma comunidade organizada, onde já havia escola e luz elétrica, tudo feito pela comunidade. Ele voltou e falou para o juiz que devolveu o processo para a Terracap.

Repórter – Quando foi isso?

Aníbal - Isso foi em 1989, quando o atual governador Joaquim Roriz foi colocado pelo presidente José Sarney como interventor no Distrito Federal. No dia 2 de abril daquele ano ele esteve aqui e proferiu uma frase de estadista: ‘as coisas fáceis eu resolvo agora; as difíceis, daqui a pouco; as impossíveis eu marco data para resolver’. Chamou o procurador geral e perguntou quanto tempo demoraria em resolver nossa questão. Ele disse que precisaria de 20 dias. Ficou marcado para o dia 24 de abril o regresso do senhor Joaquim Roriz, com uma solução. Mas, no dia 23, o governador me chamou e disse: ‘Aníbal, não demos conta de resolver. Se você assumir a responsabilidade dizendo que vocês não arranjaram a papelada eu volto amanhã a Casa Grande’. Eu assumi a responsabilidade e ele voltou, atribuindo a nós o motivo da não solução para o nosso caso.

Repórter – Por que o senhor assumiu essa responsabilidade?

Aníbal – Porque eu sabia que esta era uma questão difícil. Mas, em toda oportunidade que havia, eu fazia uso do microfone para lembrar ao governador a frase que ele havia proferido: ‘as coisas fáceis eu resolvo agora; as difíceis, daqui a pouco; as impossíveis eu marco data para resolver’. Finalmente ele me confessou que não tinha competência para resolver o caso. Orientou-me então para que fossemos à Câmara Distrital, recentemente criada, e pedíssemos para os deputados fazerem uma lei institucionalizando o núcleo rural Casa Grande, que ele sancionaria. Fomos e conseguimos o apoio do deputado Peniel Pacheco, para a elaboração da lei. Em menos de seis meses o projeto foi votado. No dia 6 de outubro de 1994 o governador Joaquim Roriz sancionou a Lei 674/94, Decreto 15.969, instituindo o Núcleo Rural Casa Grande e ordenando que fosse traçada sua poligonal.

Repórter – Então estava tudo resolvido?

Aníbal – Ainda não. Essa questão fundiária continuou. No governo Cristóvão houve nova tentativa de reintegrar a fazenda Bom Sucesso, só que ele não teve recursos para indenizar o que já havíamos investido. Até hoje ainda não há uma solução definitiva sobre a questão fundiária. Nós temos escrituras registradas em cartório. Em 2006 o GDF reestrutura o Plano Diretor de Ordenamento Territorial – PDOT, que é uma revisão de toda a lei fundiária, feita de 12 em 12 anos. Mas, até hoje, o PDOT/DF desconheceu a área rural. Os núcleos estão se movimentando para que a área rural conste no PDOT. No dia 17 de abril de 2005 nós fizemos aqui uma audiência pública e a comunidade decidiu que Casa Grande deve permanecer como área rural. Somos absolutamente contra o parcelamento das chácaras. Não queremos que Casa Grande se transforme numa Vicente Pires II, sem planejamento. Temos espalhados 18 outdoors difundindo a filosofia do não parcelamento e sim o empreendimento agroindustrial. Encaminhamos nossas reivindicações à Administração Regional do Recanto das Emas e à Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitacional – SEDUH, pedindo que respeitem nossas decisões.

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