Arlindo Kunzler veio para Brasília como deputado federal eleito no Rio Grande do Sul. Desiludiu-se com a política partidária eleitoreira e passou a se dedicar a práticas políticas mais puras, que visam o bem estar da comunidade. Em 1970 comprou a fazenda Monjolos, posteriormente transformada em granja Bom Sucesso. Foi vice-presidente da Associação dos Moradores e Produtores Rurais de Casa Grande e presidente da comissão de construção da igreja São Francisco. Repórter – Como foi que você começou seu investimento rural no Distrito Federal? Arlindo – Eu era deputado federal pelo Partido Social Democrático (PSD/RS). Em 1967 vim cumprir meu primeiro mandato. Mas um homem ligado à terra não pode ficar sem ela. Então, além das minhas atividades parlamentares, procurei logo me religar à terra aqui no Distrito Federal. Em 1970 comprei uma área de 180 hectares no núcleo rural Monjolos, hoje integrada ao núcleo rural Casa Grande. Essa área pertencia à família do Eduardo Pereira, da qual comprei os direitos hereditários. Desenvolviam nela a cultura de subsistência. Implantei uma granja para produzir gado leiteiro, gado de corte, galinhas, peixes, ovelhas, frutas, verduras... Uma produção integrada. A granja Bom Sucesso existe até hoje. Seu nome se deve à fazenda Bom Sucesso, com a qual fazia divisa, e que deu origem às chácaras do núcleo rural Casa Grande. Repórter – Na região não havia infra-estrutura. Como produzir sem estradas, sem energia elétrica e sem comunicação? Arlindo – Para desenvolver as atividades rurais começamos trazendo a luz elétrica. Construímos uma rede particular desde a entrada do Gama, financiada pela cooperativa rural do Distrito Federal. Ao mesmo tempo abrimos uma estrada com nosso próprio trator, para levar sementes e produtos. Fizemos algumas pontes e bueiros. Para chegar na minha granja se passa pela propriedade dos lassalistas, que têm o Colégio Lassale na 505 sul do Plano Piloto. Entre 1970 e 1980 ficamos nessa labuta de levar luz elétrica, abrir estradas e criar meios de comunicação. Nesse período apareceram mais alguns vizinhos que se instalaram ao longo da rede elétrica e da estrada. Em 1980 começou o movimento na fazenda Bom Sucesso, para implantar as chácaras do núcleo rural Casa Grande. Repórter – Houve contato desde o início entre você e os chacareiros de Casa Grande? Arlindo – Conheço o professor Aníbal o Pedro Machado desde essa época. O professor Aníbal é o líder que chegou para legalizar as chácaras de 20 mil metros quadrados. O Pedro Machado administrava a área. Foi pelo trabalho deles que se viabilizou a formação deste núcleo rural. Essa fazenda era devoluta. A que eu havia comprado era particular e logo que adquiri os direitos procurei a fundação zoobotânica para que a medisse e demarcasse. A posse foi mansa e pacífica. Mantenho constantemente duas famílias registradas para tomarem conta das atividades produtivas da granja. Repórter – Você nasceu no Rio Grande do Sul? Arlindo – Sim, no município de Monte Negro. Entre 1954 e 1966 fui deputado estadual. Entre 1967 e 1982 fui deputado federal. Sempre estive ligado à contabilidade, ao comércio e à atividade rural. Quando vim a Brasília procurei me manter integrado a essas atividades. Afastei-me da política porque, em 1978, colegas do meu partido implantaram a corrupção eleitoral no estado. Compravam votos prejudicando a mim, ao deputado Alberto Hoffmann e ao deputado Alberto Schmidt, que representávamos a região há muitos anos. Enjoei-me e renunciei à vida política, porque não me dispus a competir com os corruptores na compra de votos. Sempre fui eleito por mérito pelo trabalho prestado. Em 1982 fui integrar a assessoria jurídica do ministério da educação, para cuidar das escolas agro-técnicas federais. Na minha gestão implantamos mais de 200 escolas técnicas e agro-técnicas. Repórter – Estando próximo a Casa Grande e posteriormente fazendo parte dela, como se deu o seu envolvimento com este núcleo rural? Arlindo – Eu estava na vizinhança deste núcleo rural em fase de implantação e vi que a liderança do movimento era formada por pessoas comprometidas. Com base na minha experiência falei a eles que para obterem sucesso no empreendimento precisavam começar abrindo estradas e implantando a luz elétrica. Casa Grande nasceu do espírito de parceria da comunidade com o governo. Juntei-me à associação e procuramos o Departamento de Estradas e Rodagens (DER) do Distrito Federal para implantarmos rodovias que permitissem o desenvolvimento da região. Cedi o cascalho da minha granja para a pavimentação que os novos chacareiros se cotizaram para pagar. O governo fez o projeto e fiscalizou a obra. A mesma coisa aconteceu com a rede elétrica: ofereci o final da minha rede para levar energia aos primeiros moradores de Casa Grande. Caso contrário seria necessário 15 a 20 quilômetros de rede. Então, tanto o asfalto quanto a rede elétrica de Casa Grande foram implantados com a colaboração da granja Bom Sucesso. Repórter – Como você avalia o movimento comunitário de Casa Grande? Arlindo – Os passos foram dados de forma correta. O Aníbal é um homem muito religioso que foi enviado pelo Dom Ávila para despertar o espírito religioso na comunidade. Eu e o Pedro Machado integramos o movimento contribuindo com a associação dos moradores. Construímos a escola, o salão, o posto de saúde, o posto policial, etc. Depois de criada a infra-estrutura social havia a necessidade de construirmos a igreja. Então o Aníbal me convidou para ser o vice-presidente da associação e que eu assumisse a presidência da comissão responsável pela construção da igreja, da qual ele foi o vice. Essa integração foi positiva do ponto de vista social e religioso. Mais tarde o pessoal da Castelo Forte veio somar, bem como outros proprietários que se estabeleceram na área. Fui presidente da comissão de construção da igreja até sua inauguração. Foi uma luta maravilhosa. Havia vários doadores de áreas para a igreja. Chamamos o cardeal de Brasília, Dom Falcão, para ajudar a escolher o local. Quando ele avistou o morro no meio do cerrado disse: ‘aqui vai ser a igreja da comunidade de Casa Grande. Aqui vão se dar muitos prodígios’. Repórter – Então a igreja foi construída no alto desse morro? Arlindo – Estava decidido. Tínhamos o local e a intenção de construir, mas ainda não sabíamos quem era o nosso padroeiro. Pedimos autorização ao Dom Falcão para que a própria comunidade escolhesse. Normalmente são representantes da igreja quem decide qual é o santo padroeiro de cada comunidade. Em outubro de 1998, no dia de eleições gerais para prefeitos em todo o Brasil, como em Brasília não há eleição para prefeitos, aproveitamos para eleger nosso santo padroeiro. Fui o fiscal da urna e meu candidato era Santo Antônio. Concorria também Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Nazaré, Dom Bosco... Depois do pleito, que durou o dia inteiro, a maioria escolheu São Francisco. Repórter – Agora já sabiam inclusive para quem iriam construir a igreja? Arlindo – Sim. Assumi então a presidência da comissão encarregada da construção cuja história é entremeada de sobressaltos alegres e tristes. Muitas vezes ficamos no fundo do posso, sem saber como continuar. A obra ficou no esqueleto durante muito tempo, ameaçada pelos ventos fortes que assolam a região. Eu e o Aníbal fomos atrás de financiamentos particulares para concluir a obra até a sua cobertura. Dali em diante as vocações aumentaram e, em pouco tempo, temos isso que está ali. Todos ajudaram: crianças, mulheres, os de menos recursos, os mais idosos. Todos tiveram a oportunidade de participar desse movimento que nos motivou profundamente. Repórter – É a infindável comprovação de que ‘a união faz a força’? Arlindo – O segredo de tudo está na parceria. Este é o grande sentimento que se enraizou em Casa Grande e serve de modelo para muitos núcleos rurais. O governador do Distrito Federal e seus secretários estiveram aqui diversas vezes e os projetos do governo para as áreas rurais são implantados primeiro em Casa Grande porque aqui sempre dão certo. Repórter – O que você quer para o futuro de Casa grande? Arlindo – Nós cuidamos principalmente da parte legal, para que não houvesse invasões ou loteamento das chácaras. A associação sempre esteve empenhada para que a área permanecesse rural. Há unanimidade pelo não parcelamento a fim de que conservemos essa qualidade de vida. Em abril de 2005 presidi a reunião do PDOT e nela decidimos que a área deve permanecer rural. Agora espero que venham os benefícios estruturais como a melhoria da malha viária, iluminação pública, transporte coletivo, etc. Os programas sociais e as pastorais da igreja estão funcionando a pleno vapor. Nossa igreja está no último degrau para se tornar paróquia. Repórter – Ao que se deve seu envolvimento religioso? Arlindo – Nunca estudei para ser padre. Antigamente os pais colocavam os filhos no seminário para estudar. Caso não ficassem padres esperavam que pelo menos se tornassem bons pais de família. Minha mãe era profundamente religiosa. Meus quatro irmãos mais velhos estudaram em seminários e eu cheguei a entrar na fila. Sempre estive ligado a construções de igrejas. Em Porto Alegre ajudei a construir a igreja São Sebastião. Em Brasília faço parte da comissão de manutenção da catedral e das igrejas de São Judas Tadeu, Santo Antônio, Nossa Senhora de Guadalupe, das do Recanto das Emas entregues ao padre Geovani e da nossa igreja São Francisco de Assis. Estou familiarizado com esse aspecto religioso e não consigo viver diferentemente. Repórter – Mais algo a dizer? Arlindo – Teríamos ainda muita coisa para contar. Mas, sobretudo, quero agradecer ao professor Aníbal que conseguiu unir e integrar essa comunidade formada pouco a pouco, por pessoas estranhas. Manteve sempre a mesma linha doutrinária. Sempre que chega alguém com dificuldade a associação está ali para prestar socorro. Felizmente hoje nós temos apenas que observar os exemplos dos nossos antepassados e seguir o nosso rumo. Estamos no caminho certo e queremos dar isso como exemplo para o Distrito Federal. Agradeço a vocês que estão contando essa história, à Castelo Forte que investe na iniciativa, para que este assunto seja lavrado e fique escrito para a posteridade. |
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